quinta-feira, 30 de julho de 2015

O dia que conheci o fundador da Banda de Pífanos de Caruaru- Risomar Fasanaro



Em 2013 fui convidada pelo casal Cupertino e Edna dos Santos para conhecer o fundador da Banda de pífanos de Caruaru. Era uma quarta-feira quando minha amiga Edna e eu chegamos à casa de Sebastião Biano, no bairro de M’boi Mirim. Ele nos recebeu à porta, e me foi difícil acreditar que aquele senhor que não aparentava mais de 70 anos, estivesse com 93.
Vendo e conversando com ele, fui tomada pelas lembranças da minha terra: as cirandas de Lia, o pastoril de Piedade, bumba-meu-boi e reisado, maracatu e, sobretudo, a banda de pífanos de Caruaru.
Ali naquela sala, ouvindo a história de Sebastião, meu ouvido interno “escuta” o som da banda enquanto ele me conta: a história dele começou quando ainda era muito criança. Foi quando em 1924 o pai, Manuel Clarindo Biano viu uma banda de pífanos tocando em uma novena em Alagoas. Os sons da banda encantaram aquele homem que fugia da seca, não saíram mais de sua cabeça, e se alojaram em seu coração.

Anos depois ele levava os filhos pra roça, para aprender a plantar o roçado. Brincando, as crianças, Sebastião Biano então com 5 anos e o irmão com 7, descobriram que fazendo 2 furos nos talos das folhas de jirimum ( abóbora) era possível extrair algum som. Naquele instante a emoção tomou conta daquele lavrador, só de pensar que ali começavam a despontar aqueles músicos. Naquele instante decidiu procurar alguém que confeccionasse pífanos para os dois garotos:
-Vocês vão aprender a tocar.
O pai mandou fazer uma par de pífanos porque para fazer 1ª e 2ª voz é preciso que haja um par, e quando os instrumentos chegaram, os meninos começaram a ensaiar, o que seria a nascente Banda de Pífanos de Caruaru.
Mas não bastou ver os filhos tocarem, analisando como os instrumentos eram feitos, ele resolveu tentar fazer um. Deu certo, e tendo aprendido com o pai, hoje Biano também faz pífanos que vende aos interessados.
O músico nos explica que os instrumentos são feitos de taquara que ele colhe em terra bem úmida, na mata.
No início, a banda tocava só em novenas, enterros de crianças e nas festas religiosas. Percorriam longas distâncias, para se apresentar em cidadezinhas do nordeste. Vida difícil, bem diferente dos locais em que hoje se apresenta.
Encantada com a história que ouvimos, peço a ele que toque um pouco e ele não se faz de rogado, toca “Asa Branca” e outras composições suas. É impossível traduzir a emoção que sinto ao ouvir o que para nós, nordestinos, é um hino. Em seguida, ele me presenteia com um pífano, e nos convida para um café. Enquanto tomamos café com ele e a filha, ele continua falando sobre a trajetória do grupo:
Em 1939 a família Biano chegou a Caruaru, no interior pernambucano, onde decidiu se estabelecer. Com a morte de Manoel, em 1955, a zabumba foi assumida por João, o primeiro neto do fundador a integrar o grupo, então batizado oficialmente de Banda de Pífanos de Caruaru. E logo começou a fazer sucesso. Biano conta que eles tocaram para Gilberto Gil, e se lembra do encantamento do compositor com o trabalho do grupo.
Hoje, a banda ainda é formada por membros da família, e no repertório não faltam baiões, cirandas, xotes, a maior parte composições dele em parceria com algum componente do grupo.
Sebastião Biano e seu grupo já tocou muitas vezes “com Luiz Gonzaga, com Jackson do Pandeiro, Anastácia, Marinês, Trio Nordestino, e vários outros”, diz ele, referindo-se aos artistas que deram consistência a esse gênero musical.
Em 1972, a banda veio para SP gravar o primeiro LP, “Banda de Pífano Zabumba Caruaru”. Aqui participaram de documentários, espetáculos e de discos de outros artistas. Em 1973, gravaram o volume 2 de “Banda de Pífano Zabumba Caruaru”. Depois viajaram para apresentações no exterior, onde fizeram muito sucesso.
Em 1999 eles sofreram uma grande perda: Benedito Biano, um dos fundadores do grupo, faleceu em São Paulo, vítima de problemas cardíacos. Mas a banda continuou se apresentando e nesse espaço de tempo, gravou mais seis discos, hoje CDs, e é reconhecida no cenário musical nacional e internacional, tendo recebido o prêmio Grammy Latino, na categoria de Melhor Grupo Regional de Raiz, com o disco “Banda de Pífanos de Caruaru: No Século XXI”, em 2004.
Em 2005, na segunda edição do Prêmio TIM de Música, Sebastião recebeu o prêmio de Melhor Grupo na categoria regional, das mãos do então presidente Lula. Hoje este grande artista é um homem sereno, tranquilo que deixou Caruaru e vive em M-boi mirim; mas continua se apresentando e encantando o público.
Agora com o Trio "Esquenta muié",se apresentou recentemente no Sesc Santana,com a participação de Naná Vasconcelos e Siba", no lançamento de seu CD.E como disse minha amiga Edna: "foi de chorar, coisa que sempre faço quando o ouço tocar.".
São muitas as histórias que ele entusiasmado nos conta. Entre elas a de que quando era pequeno tocou para Lampião. E disse que ele e o irmão tremendo de medo, mal conseguiam segurar os pífanos, mas que logo ficou à vontade com o comentário do cangaceiro. Ao ouvi-los tocar, ele teria comentado com seus homens: “olhem só, esses meninos tão pequenos e já tocam e vocês não sabem fazer nada...”
Saímos daquela casa, Edna e eu, ainda “ouvindo” o som de “Asa Branca”, ainda com pedaços das histórias daquele homem tão gentil, tão simpático, tão jovem nos seus 94 anos...







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