sexta-feira, 22 de maio de 2015

O Eclipse - Jailson Vital



Nos dias de hoje a crendice em fantasma, alma penada, lobisomem, vampiro, etc., está desmoralizada. Os filmes de terror que antigamente nos assustavam tanto e nos deixavam sem dormir, hoje são comédias, e os personagens embora de aparência aterrorizadora e executando ações macabras, só provocam gargalhadas dos jovens espectadores. No entanto, uma parcela grande da população, principalmente aquela menos culta, ainda acredita que fenômenos naturais, como enchentes, secas prolongadas, grandes incêndios e eclipses, são castigos de Deus ou sinais do fim do mundo. Imaginem essa situação no início da década de 60. Ou melhor, imaginem o anúncio em Custódia, de um eclipse total, naquela época. Pois eu lhes conto.
O anúncio de que haveria um eclipse total da lua, trouxe inquietação a grande parte dos moradores e então, começaram a correr os boatos dos malefícios trazidos por esses acontecimentos, como doenças, pestes e mortes. Mas corria também, para alívio dos desesperados, a receita do antídoto para tudo isso. À semelhança dos castigos de Deus ao faraó e seu povo, no episódio bíblico das 7 pragas do Egito (Êxodo), onde a salvação para os israelitas seria pintar as ombreiras das suas portas com sangue de cordeiro (pois Deus veria esse sinal e seu castigo não entraria naquela casa), a salvação para os custodienses(*) naquela ocasião, seria colocar um ramo de pinhão bravo, planta endêmica da caatinga, ou um galho de arruda, em um vidro com água e colocá-lo pendurado na porta de entrada das suas casas.
Alguns estudantes, eu entre eles, achávamos aquilo tudo um absurdo e tentávamos explicar a algumas pessoas que, o eclipse se tratava de um fenômeno natural, causado pelo alinhamento do sol, da terra e da lua, mas éramos vozes vencidas. Éramos pouquíssimos em relação aos que criam que o ramo de pinhão era a barreira contra o mal iminente. Não nos conformávamos vendo que quase todas as casas tinham um vidrinho com um ramo de pinhão ou arruda pendurado na porta.
Então “bolamos” um modo de demonstrar esse absurdo. Naquela noite, quando aconteceria o eclipse, já altas horas, quando todos dormiam, saímos no jeep de propriedade de um de nós, e cuidadosamente, fomos recolhendo os vidrinhos e colocando-os no jeep. Ao final da coleta, fomos para a praça em frente à igreja, e lá, em uma construção circular de paralelepípedos, construída talvez com a intenção de futuramente ser colocada uma estátua ou um busto de algum político, fomos depositando os vidrinhos.
No dia seguinte ao acordarmos, fomos para a praça para vermos a reação dos que paravam para ver aquilo, sem entender o que significava, nem como todos aqueles vidros tinham ido parar ali. Os comentários e opiniões eram os mais diversos, inclusive os fantásticos. Havíamos finalmente demonstrado que, mesmo sem o pinhão e sem a arruda, estavam todos sãos e salvos.
Cerca de cinquenta anos depois, apesar de todo avanço que o mundo teve, tivemos que assistir, não em Custódia, mas no mundo inteiro, milhares de pessoas se refugiando em cidades pseudo imunes e refúgios construídos com milhares de dólares, para escapar do “fim do mundo” que aconteceria no dia 21 de dezembro de 2012, supostamente predito pelo calendário Maia.


(*) nascidos ou
moradores da cidade de Custódia- Pernambuco.

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