quinta-feira, 27 de novembro de 2014

RECORDANDO a professora LAURA AMÉLIA ALVES VIVONA - João dos Reis


RECORDANDO a professora LAURA AMÉLIA ALVES VIVONA

“Érase de un marinero
que hizo un jardín al mar,
y se metió a jardinero.
Estaba el jardín en flor,
y el jardinero se fue
por esos mares de Dios".

(Antonio Machado, poeta espanhol)


Tinha 16 anos, tinha vivido uma fase de dúvidas, de incertezas, de desemprego. Foi nas aulas de LAURA AMÉLIA ALVES VIVONA que descobri o mesmo interesse pelos livros, pelas idéias. Foi minha professora de Francês e Espanhol nos dois anos do colegial no Ceneart e no cursinho para o vestibular.

Era bonita, culta, elegante – e estava encantado por sua personalidade apaixonada. Não me esqueci: em um aula me perguntou de chofre: “o que te lembra a cidade de Salamanca?” E eu disse: (Miguel de ) “Unamuno”. E a resposta dela: “você me emociona!” Ninguém até então me havia dito que eu poderia comover com minhas leituras.

As aulas de literatura eram verdadeiros espetáculos de declamação de poemas e dramatização de textos. As palavras apareciam carregadas de cores, de sentimentos. A tradução e a reflexão sobre o texto “A intencionalidade”, de Jean-Paul Sartre foi magistral. Descobri a fenomenologia, a presença das coisas, o significado que damos a elas. Somos nós que construímos nossas memórias, que atribuímos sentido a elas . Li “O estrangeiro” de Albert Camus, indicado por ela – e fui também um jovem existencialista.

Em um dos seus aniversários, ganhou de presente o livro “A velhice” de Simone de Beauvoir. Comentou as agruras que o destino lhe reservava. Eu tinha 18 anos – e foi a primeira vez que pensei sobre a idade em que estamos próximos de nos despedirmos da vida.

Terminei o curso de Filosofia, e depois de 8 anos lecionando no Litoral Norte, procurei-a no Ceneart em 1980. Dessa vez, foi ela que me emocionou, quando disse que “eu a marcara muito (como aluno)”. Disse que a ditadura militar retirara a disciplina do currículo escolar, mas que já estava trabalhando (na FNT) – e ela quis saber se o que eu ganhava era suficiente. Eventualmente, escrevia uma cartinha e conversávamos por telefone; já não era mais o adolescente fascinado pela professora, mas um adulto que prestava homenagem à figura feminina mais marcante da minha juventude.

No final dos anos 90, fui viver no Sul, no Paraná. Quando voltei em 2005, procurei a sua casa na rua Moacir Piza em São Paulo – mas não a localizei; o porteiro de um prédio vizinho a conhecia, me falou dela. Soube depois que ela havia falecido – e nesse dia, busquei o silêncio para dar meu adeus à professora que mais amei.

3 comentários:

  1. Agradeço suas palavras, João. Sou filha da Laura e sei o quanto ela amava o ofício e os alunos. Seu post, a que cheguei por acaso, me deixou orgulhosa e comovida; foi importante mostrá-lo aos netos e sobrinhos mais jovens. Ela faleceu em 2008, perto da velha casa da Moacir Piza -- pena que vocês se desencontraram! Muito obrigada e um abraço,

    Laura Aguiar

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  2. Laura: fiquei triste por não ter encontrado sua mãe, depois que voltei do Sul. Fiquei feliz em saber que gostou da crônica - e que a mostrou para os netos e sobrinhos. Um abraço. João dos Reis

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