segunda-feira, 10 de novembro de 2014

REFLEXÕES sobre livro: "A greve no masculino e feminino - Osasco, 1968" - Marta G.O.Rovai - Texto de João dos Reis


O livro da historiadora retoma a história de Osasco, a construção da cidadania osasquense, a greve de 1968, seus personagens.Os depoimentos estão presentes em todas as páginas. Falam sobre a experiência vivida, as emoções, as lembranças. Ao contrário das teses acadêmicas em que os entrevistados desaparecem no pé da página ou constam no apêndice final: surgem a todo o momento, contando o que foram esses agitados anos 60.

As figuras femininas narram a experiência do ponto de vista das mulheres. Maria Santina e Abigail Silva, casada com João Joaquim, se tornam protagonistas da História, ao lado de muitas outras.

É também uma reconstituição da efervescência politica no bairro paulistano que conseguiu emancipação depois de 3 tentativas – a última em 1962. Risomar Fasanaro, professora, escritora, poetisa, foi uma das agitadoras da cultura na cidade proletária.

Recordando: Helena Pignatari Werner, professora de História do Ceneart, foi presa depois do golpe de 1964. Acusação: subversão por ter um projeto de alfabetização de adultos segundo o Método Paulo Freire. José Ibrahim, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos, preso depois da greve de 1968 – conseguiu a liberdade depois do sequestro do embaixador norte-americano. Antonio Roberto Espinosa, cursava Filosofia na USP, um dos operários-estudantes presentes na agitação revolucionária - esteve preso por mais de 4 anos. José Groff, metalúrgico, militante da Pastoral Operária e da FNT- Frente Nacional do Trabalho. Joaquim Miranda, metalúrgico, militante da Ação Católica Operária. Albertino Souza Oliva, participante da Comissão de Fábrica da Cobrasma, militante da FNT.

A escritora retoma a proposta do filósofo Walter Benjamim: a narrativa pode renascer as esperanças do passado. Por meio da memória, também o retorno do direito às lembranças e às palavras.

O último capítulo, “As feridas da memória: experiências de dor, coragem e afeto” trouxe novamente uma avalanche de recordações dos amigos. O desemprego, as perseguições dos patrões (entraram para a lista do Dops), as mudanças constantes de fábrica. Acompanhei a maratona deles em busca de trabalho no inicio dos fanos 70.

“Da condição de acusados, os narradores tomaram a palavra e passaram a acusar: o torturador passou a ser réu da História...” escreve Marta. Reapareceu a imagem de um encontro que tive com Joaquim Miranda e com Natael Custódio Barbosa, depois da prisão. Lembro que conversamos, mas não sabia o que dizer aos companheiros.

Senti a falta de alguns atores: Gabriel Roberto Figueiredo, estudante-operário, Josué Augusto da Silva Leite, professor de História no Ginásio de Presidente Altino - meus ídolos, meus heróis no final da infância e adolescência: contribuíram para a formação política da geração que desafiou o poder da ditadura militar.

A História nos devia esse registro da “Petrogrado brasileira”, nas palavras de Espinosa. Meu querido José Groff, irmão-camarada, não está presente para comemorar esse acontecimento – ele é um dos que se despediu de nós, deixando muitas saudades.

( “A greve no masculino e feminino – Osasco, 1968”, Marta Gouveia de Oliveira Rovai (Edit. Letra e Voz, S.Paulo, 2014, 362 pp)





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